LEMBRANÇAS DE ELISEU RESENDE

É difícil para mim dar adeus a Eliseu Resende. O nome dele permeia boa parte da minha existência. Ainda ontem, remexendo baús, encontrei velho documento pelo qual meu pai, Raimundo Cândido Vieira, foi promovido no Departamento de Estradas de Rodagem (DER-MG). Quem assinou o ato como diretor-geral do órgão? Adivinhe! Eliseu Resende, claro. Ele se formou engenheiro, doutorou-se em Nova Iorque na área de filosofia, tocou grandes obras, ocupou altos postos de comando e avançou na idade sem perder o entusiasmo, a fé em Deus e a esperança nos homens. Acima de tudo, um simples. Se dependesse dele, seria eternamente “o menino de Oliveira”, como o chamávamos na campanha “Mãos à Obra”, quando ele concorreu ao Governo de Minas. Do outro lado, Tancredo Neves, também figura de relevo na vida nacional. Época dourada: havia tantas reservas morais no serviço público! Não me sai da mente a marchinha do “menino de Oliveira”. Começava assim:

“Vamos, minha gente!/ Juntos, vamos votar./ A hora é esta/ e o povo já escolheu/ para governador: Eliseu”.

Depois o locutor entrava com o texto: “Eliseu Resende nasceu em família numerosa. Desde criança, o trabalho faz parte de sua vida. Aos 12 anos, para custear os estudos, já trabalhava como contínuo de banco (...)”. E por aí seguia o horário eleitoral no rádio e na TV. Que saudade!

Essas lembranças são para informar aos menos avisados que praticamente nasci admirador de Eliseu.

O tempo caminhou, caminhou... Eliseu chefiou o DNER (atual DNIT), foi ministro dos Transportes no Governo de Figueiredo e da Fazenda no de Itamar Franco. Neste derradeiro cargo no Executivo, sofreu calúnias por não ceder à pressão de certos grupos, à pressão daquela gente que, segundo Edson Nery da Fonseca, ex-assessor especial do Planalto, insiste em transformar o poder em “verdadeiro ninho de víboras”.

Chega 1994. Lá uma bela noite de sexta-feira, mês de junho, recebo a visita dos amigos doutor Rubens Bittencourt e Zé Reinaldo (este atualmente nos invisíveis espaços). E eles me dizem logo, à queima-roupa:

– Estamos aqui em nome do doutor Eliseu Resende. Como você mostrou muita eficiência na campanha do Ronaro Corrêa, queremos convidá-lo a assumir a Comunicação da campanha do Eliseu. Ele será nosso candidato a deputado federal. É uma das mais brilhantes inteligências do Brasil, mas precisa de um trabalho sistemático para divulgá-lo aqui na região. O Ricardo Campos, ex-revista VEJA, ficará direto em contato com você, dando-lhe todo o suporte necessário.

– Desde bruguelo sou fã de carteirinha do doutor Eliseu. Podem contar comigo, respondi.

Terminado esse breve diálogo, fomos comemorar minha contratação nas barraquinhas de Santo Antônio.

Sucederam-se estafantes reuniões e viagens. Doutor Rubens com a tarefa, árdua, de conseguir a adesão dos prefeitos e vereadores. Na Câmara de Curvelo, formou-se o Grupo dos Sete, composto por Edson Eugênio, Afrânio Diniz, Altino Borges e outros parlamentares. Eu dava uma de advogado do diabo e apresentava N razões para o eleitor curvelano e circunvizinho não simpatizar com Eliseu. Doutor Rubens, macaco velho, ia derrubando meus argumentos, um a um, mediante provas de que esta ou aquela declaração carecia de fundamento. Elaboramos, assim, uma espécie de questionário, com respostas claras e objetivas. Recorremos aos mestres da ciência política, da sociologia, do “marketing”, enfim, mergulhamos, com o escafandro do bom-senso, em oceanos teóricos indispensáveis. Destarte, ficou pronta a estratégia com a qual nos lançamos no corpo a corpo em todo o centro-norte mineiro, empunhando a bandeira de Eliseu Resende. Aqui e em vários lugares, a dobradinha era com doutor Viana para a Assembleia Legislativa. Quase toda semana nos reuníamos com a imprensa. Adonias Ribeiro, hoje diretor do CENTRO DE MINAS, trabalhava em O MOMENTO REGIONAL e participava dos encontros. Seu Nilson Gonçalves, idem. Só deixou de aparecer em algumas ocasiões, em virtude de acidente automobilístico. Delém terminava seu programa matinal na Rádio Clube e, antes de almoçar, passava pelo comitê para se inteirar das novidades comigo. O mesmo fazia Geraldo Salles França, apresentador dos comícios. Ideumar Gonçalves, diretor da FOLHA DE CURVELO, e Eustáquio Pizani, colunista de CN, foram outros que abraçaram a nossa causa. Enfim, ninguém da mídia nos fechou as portas. Detalhe importantíssimo: os apoios eram con-quis-ta-dos, se é que o leitor me entende. O candidato se propunha a ajudar Curvelo, e essa proposta a todos seduzia, de maneira natural.

Não deu outra: Eliseu virou o representante dos curvelanos em Brasília. Teve mais dois mandatos de deputado federal e, ao morrer em São Paulo, no início de 2011, estava no primeiro quatriênio como senador da República. Canalizou inúmeros benefícios para este município, independentemente de quem estivesse à frente da Prefeitura. Mudou a fisionomia da cidade. São testemunhas disso os ex-prefeitos Paulo Dayrell, doutor Sebastião Salomão e, de modo especial, Maurílio Guimarães. Maurílio considerava Eliseu como um pai e, com o respaldo dele, realizou em Curvelo duas gestões que, de tão profícuas, dispensam comentários.

Sem alarde, como era de seu feitio, Eliseu se despediu de nós. E quem não se sentiu lá embaixo ao se despedir de Eliseu?

A Prefeitura de Curvelo deveria ter decretado luto oficial pela morte daquele que, depois de doutor Dalton Canabrava, tornou-se o maior benfeitor do Município. Não o fez. Por que será? Mistério...

Quero encerrar minha arenga, mas ainda não sei como dar adeus ao autêntico “Homo faber”, que era também sonhador, ao mesmo tempo formiga e cigarra; não sei que diga ao “Engenheiro do Progresso”, ao responsável maior pela retirada dos trilhos do centro de minha terra, ao filósofo apaixonado pela obra de Drummond. A luta pela existência me chama. Tenho de pôr um ponto-final no texto. Então paro. Mas o faço desolado, nada obstante a certeza drummoniana de que: “As coisas tangíveis/ tornam-se insensíveis/ à palma da mão./ Mas as coisas findas,/ muito mais que lindas,/ essas ficarão”.

Descanse em paz, Eliseu! Tenha o sono dos justos!

(*) O TEXTO ACIMA É DO MEU AMIGO NEWTON VIEIRA, da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais - AMULMIG"